terça-feira, fevereiro 27, 2018

Até

Já acreditei em felicidade,
em amor de verdade,
em palavras que ninguém sabe bem o que é.

Escondi-me em um monte de frases,
fingi entender as mensagens,
fiz pose, apontei no alvo,
mas, no final, dei no pé.

Vivi coisas sem sentido,
ao lado de quem admira o próprio umbigo,
cansei da vida
e perdi a fé.

Só que na última linha,
no último instante,
na hora do adeus,
como sempre,
recomponho-me e
rendo-me a um breve “até”.

segunda-feira, fevereiro 26, 2018

O valor da ilusão

A morte da sentido a vida,
é a prova que existiu a estrada,
mas se nasce à sua imagem,
cresce ao seu lado,
não conhece alivio,
nem resguardo,
impõe um penoso convívio,
o mais pesado fardo.

Não agradece nem a hospedagem,
limita-se a partida,
e deixa a quem sobrevive à passagem
o desafio da vida.

E quem sonha com a morte amiga,
previsível, justa e sensata,
esquece que, como a vida,
é só ilusão planejada,
que difere da morte em uma razão,
não é destino comum,
o valor da ilusão,
cabe a cada um.

Tanto faz

Quem não perdoa os mortos,
que não magoam mais?
Quem não esquece os atos
de um autor que nos deixa em paz?

Quem não o perdoou em vida
e, agora, sabe que tanto faz.

fim (minúsculo)


foto: Cláudia Azedo

Chega da companhia da solidão,
de fantasmas pela casa,
de casuais encontros no corredor.

Chega de guardar na conveniente rotina
motivos torpes para ficar
e ver passar tantos dias
sem ter nenhum para guardar.

Chega.

Chega de viver do passado
de diminuir o presente
de não reconhecer que só a morte não sai do lugar.

Chega.

Chega de tantas desculpas
de meias verdades,
de "vem me calar".

Desta vez

Talvez o amor nunca tenha estado tão perto.
Talvez nunca tenha sido tão óbvio.
Talvez nunca tenha vencido tantos percalços.
Talvez.

E, por isso,
só desta vez,
e já é outra vez,
possa nunca mais ser talvez.

segunda-feira, dezembro 12, 2016

Lamento

Lamento
se este tormento
ainda ecoa em seu ouvido.

Lamento,
mas pelo que lembro,
é no silêncio que se ouve gritos.

Lamento, como lamento,
pelo que perde o sentido.

Lamento, que não lamentes,
pela laranja ter se partido.

domingo, fevereiro 22, 2015

muda

Mudei,
não sei bem o que,
não sei bem aonde,
só que mudei o rumo,
quando perdi o prumo, 
ao ver tudo mudar.

Mudei o que julguei necessário.
Mudei o que pude.
Mudei o inserto.
Mudei de atitude. 

Mudei o que dei conta.

E o que eu não mudei,
me mudou.

segunda-feira, fevereiro 03, 2014

O que fica

As lágrimas não lavam mais meu rosto,
mas a chuva.
Soluços não impedem mais meu sono,
hoje sonho.
Mágoas não ocupam mais meu coração,
que desabrocha.
A desesperança não cansa mais meu corpo,
que dança.

Tudo passa.
Ainda que devagar,
ainda que seja um vendaval,
ainda que eu não acredite.
Tudo passa,
a seu tempo,
comprometendo o meu,
mas passa.

terça-feira, janeiro 21, 2014

Ela e Deus

Alguém vai ter de olhar por minha filha
e terá de ser Deus.
Ela deu longos passos,
com buena onda,
sorriu
e cresceu.
Foi vencendo seus medos
[falta à redução das margens de erros],
agora é tanto chão longe do meu.
Só me cabe lhe dar 18 beijinhos,
imaginando os próximos,
ahora,
ela e Deus.

quarta-feira, dezembro 11, 2013

Como aprendi

Se a vida registra baixas,
choro.
Se dá saltos,
reequilibro.
Se é ingrata,
sou mal educada.
E se traz um presente agradeço como aprendi:
com abraços, mãos e boca (com um italiano)
e amor
(com uma linda espanhola, que acaba de partir).

sábado, novembro 03, 2012

Autor

Faz tempo que não troco a rima e suporto a rotina
– quando vi,
o dia acabou.
Chega à noite é a mesma poesia,
mais um lindo dia
que já se apagou.
Acordo com a chuva,
uma velha amiga,
que tantas vezes me inspirou.
No seu embalo espero o raiar do dia,
penso em um novo verso,
que eu não inspire,
seja só o autor.

quinta-feira, julho 28, 2011

Olhar

Tudo é um jeito de ver,
que pode levar a um jeito de ouvir,
culminar em um jeito de sentir
e fechar com uma lembrança –
do jeitinho que se quer guardar.

A vida também é como a vemos –
ainda que seja difícil de acreditar.

Mas não a longo prazo.
Com o tempo muitas imagens incontestáveis borram na fotografia.
Sons que já foram inconfundíveis distorcem a melodia.
Sensações indescritíveis revelam-se ao pé da letra.

quarta-feira, abril 06, 2011

Efêmero

Nada tem hora certa
nesta vida incerta,
mareada em um mar de ilusão.

Por aqui tudo é possível
e até o impossível
dá para pegar com as duas mãos.

Mas, enquanto o esforço é grande,
a conquista é efêmera
e nem sempre vale a recordação.