sexta-feira, janeiro 30, 2009

A morada


foto: Carlos Loff Fonseca

Não sou minha casa,
minha casa é quem sou.
Não vou para minha casa,
minha casa é onde eu for.

E sempre haverá reforma,
uma nova construção,
não há morada segura,
que o tempo não leve ao chão.

Por isso o que guardo comigo,
são os encontros que acontecem na casa,
os que estimulam mudanças no abrigo,
a começar pelo dono da casa.

domingo, janeiro 25, 2009

Eu e Matilde



Eu admirava Matilde,
sedutora e atrevida,
mulherzinha boa de briga,
rápida na devolução.

Direta com as palavras,
arrogante como a verdade.
Ora um poço de doçura,
ora ácida como o limão.

A seu lado a vida era colorida,
qualquer coisa merecia uma festa
e toda noite uma nova posição.

Matilde era tudo de bom:
um balde de água fria,
no mais quente verão.

Mas um dia Matilde morreu.
Levou suas histórias,
seus conflitos,
suas tantas lágrimas, beijos e sorrisos.

Partiu sem se despedir, como nunca imaginei.
Não se desculpou, como esperei.
Não prometeu amor eterno,
como tantas vezes fez.

Não quebrou um copo ou
esqueceu uma chave.
Não deixou um bilhete
ou instruções.

Matilde partiu com o vento
e nunca mais pisou meu chão.

sexta-feira, janeiro 23, 2009

São Paulo, eu e Santa Paula


Depois do tumulto nas calçadas,
quando o vento varre o lixo,
o que restou da multidão.
E a exausta madrugada
de maldita for beata,
não lembrar da noite passada,
de prazer e inspiração.

Minha Paula, santa Paula,
amanheça desarmada,
longe do crime,
mesmo que calada,
esqueça a culpa,
que não é tua,
pois te sugam sem perdão.

E se faz jus a fama de intratável,
de cruel e incansável,
quem enfrentar tua selva
conhece teu coração.

Como eu,
que cresci no teu concreto
de olho na tua riqueza,
mas só te vi perder a beleza
para alimentar meus irmãos.

Minha Paula, santa Paula
tua verdade nunca foi mistério,
a ti ninguém ama de graça,
e se todos pagam o preço
é porque sobrevivência é a teu brasão.

segunda-feira, janeiro 19, 2009

Vadiar


foto: Joaquim Martins

Adoraria vadiar para o resto da vida,
escrever poemas
e passar tardes comendo pêssego – branco e duro.

E se fosse de calcinha,
ao lado de um alegre homem de cueca,
passaria os dias rindo,
até perder a respiração,
e só me permitiria chorar
se fosse de pura emoção.

E, sempre que chovesse,
me sentaria na varanda
para ouvir a chuva me aconselhar.

Sem pressa, réplica ou apartes,
de posse da sabedoria
que o momento é de me calar.

De deixar o pensamento vagar
sem buscar resposta,
dar paz a mente,
ainda que a ventania bata à porta.

Tão responsável quanto um bicho,
guiado pelo instinto
e alheio a qualquer moral.

sábado, janeiro 17, 2009

Um presente


foto: Ricardo Araujo

Senhor,
traga-me um sorriso franco, fácil e largo.
Uma boca carnuda,
faminta e desbocada.

Mãos pesadas, espertas e calientes.
Pernas fortes, grossas,
quem sabe até atraentes?

Os braços talvez bem torneados,
mas só preciso que sejam valentes.

O peito que me lembre um escudo,
e os olhos que me revelem presente.

E seu coração,
Ah! Seu coração Senhor,
deverá ser, necessariamente, confortável e indulgente.
E se guloso, como o de um menino,
que conduza um homem ardente.

Mas se o que lhe peço for impossível,
pois nem ao vasculhar meu passado
achastes um só pretendente,
talvez possa me dar algum dinheiro,
ao menos me compro um presente.

segunda-feira, janeiro 12, 2009

Caio


foto: Mari Marinaro

O mundo já foi colorido,
alegre e atrevido,
uma bolinha em suas mãos.

Hoje, de tão grande não faz sentido,
cada um vai por um caminho,
e prevalece a desunião.

Na falta do seu sorriso
vingam as lágrimas.
Na falta do seu abraço
se multiplica a distância,
Na falta do seu amor
cresce o rancor.

Difícil ocupar seu espaço.
Assim como reconhecer a felicidade
sem a referência da dor.

quarta-feira, janeiro 07, 2009

Sem palavras


foto: Ricardo Araújo

Ando atrás de palavras que expressem o que sinto,
mas não consigo descrever o vazio
e fico sem palavras para variar.

Elas que tanto me servem para seduzir
não têm mais o que falar.

Se atropelam em conclusões,
depois se calam tentando pensar.
Nada faz muito sentido.
Será que vale o esforço de dizer a quem não quer escutar?

domingo, janeiro 04, 2009

Novo, por sua conta


foto: Sissi

De novo?
Não sei porque dizem que é novo?
Chega exibindo brilho
mas de fato vem somar.

Mais um ano.
Talvez mais um marco,
mais uma inspiração para recomeçar.

Mas, de novo,
como sempre,
só o que cada um renovar.